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Dinâmica da Transferência na Psicanálise

Oi, pessoal. A gente vai trabalhar alguns pontos do texto da Dinâmica da Transferência, que foi, então, o texto que vocês trabalharam na semana passada a partir das questões propostas. O Freud tem mais de um texto tratando do tema da transferência. Vocês têm, inclusive, como leitura complementar um texto de 14 sobre o amor transferencial. Mas a gente vai trabalhar esse texto porque ele vai se propor a conceituar como que a transferência se organiza, como que ela surge, desde onde ela surge.

Então, tem alguns aspectos desse texto que ficam fundamentais para nós, principalmente porque uma vez falando de transferência, a gente ainda tem que responder aquela pergunta que ficou da nossa última aula presencial de... Por que a abstinência significa, entre outras coisas, não atender as demandas transferenciais do paciente. Então, esse vai ser o nosso pano de fundo. Ao final dessas lâminas aqui, a gente tem que começar a ser capaz de responder isso.

Quando o Freud propõe o tema da transferência e pensando a ideologia da transferência, Ele começa nos apresentando uma questão, semestre que vem vocês vão ver isso de novo, quando falarem da estruturação da personalidade, da estruturação do caráter, mas que em alguma medida vocês já têm trabalhado desde psiquismo, que é como que cada um de nós se organiza como sujeito psíquico. Então a gente parte de uma ideia de que nós somos resultado... de uma disposição inata, de um conjunto de elementos hereditários, e também dos efeitos e das inscrições das experiências que a gente viveu.

Nesse momento o Freud está muito ligado à ideia da sexualidade infantil e vai lá marcar o caráter originário dela, e por isso ele está dizendo as influências sofridas durante os primeiros anos. A gente, numa leitura mais ampla, já sabe que não são os primeiros anos, no sentido dos primeiros cinco anos de vida, mas sim da vigência da sexualidade infantil. Então, que essas experiências ao longo de toda a vida vão nos produzindo efeitos e transformando a nossa personalidade.

De toda forma, o que nos importa aqui? Que a história e as experiências da sexualidade infantil, nas suas inscrições, são determinantes, são cruciais para a gente pensar como que cada um se construiu sujeito. Que é o que ele vai então marcar que é o método próprio e específico que cada um tem de levar a sua vida sexual. O que significa isso? Significa que cada um vai construir uma organização, uma estrutura que vai nos contar de quem a gente é, do que a gente ama, de como que a gente satisfaz as nossas pulsões, quais pulsões tem mais intensidades dentro de nós.

Quais são os ideais que norteiam os nossos investimentos, etc. Então a gente pode pensar esse modo próprio de condução de vida com a ideia de economia sexual. Onde a gente investe, que objetos a gente elege, que prazeres a gente busca ter, etc. E aí esses modos específicos, heranças de cada um, em cada um de nós, ele vai chamar aqui de clichês estereotípicos.

Então, a gente tem, resultado das nossas experiências de sexualidade infantil, uma série de clichês, clichês no sentido de algo que tende a repetir, algo que tende a ficar consolidado como uma estratégia sempre usada, que vai ser, então, constantemente repetida ao longo da vida. Todas as formas infantis de prazer que se tornam... um pouco mais intensas e um pouco mais prioritárias, tendem a se repetir ao longo da vida. Não se esqueçam que mesmo um sujeito que alcançou a genitalidade, ainda assim segue tendo prazeres infantis, prazeres de sexualidade infantil que permanecem vigentes. Mesmo que eles passem a ocupar um lugar de preliminar, de prazer preparatório, eles seguem prazeres vigentes.

Então, todos nós temos clichês e todos nós vamos recorrer. Há certos tipos de prazer, certos tipos de satisfação, prioritariamente. Isso vai se repetindo, isso vai sendo constantemente vivido e revivido, impresso e reimpresso. A gente recorre a esses clichês.

continuamente. E aí o que o Freud vai dizer é que esses clichês são exatamente resultados tanto dos impulsos que passaram conscientemente pelo processo do desenvolvimento, aquilo que a gente acredita, aquilo que a gente deseja conscientemente, aquilo que a gente busca porque nos faz sentido, mas também aqueles impulsos recalcados, que não ficam. ligados à lógica do processo secundário ou à lógica do princípio da realidade ou à lógica da consciência. Então a gente não repete só, a gente não tem como clichê e como parâmetro só elementos que são lógicos ou que são pensados ou que são conscientemente construídos.

A gente também repete e a gente também tem clichês que dizem respeito aos nossos prazeres mais intensos. Lembram lá da ideia de psiquismo dos pontos de fixação, aquelas experiências mais excessivas que se tornam mais prioritárias em relação às outras. E esses clichês também dizem respeito a essas experiências recalcadas da sexualidade. Então a gente também repete coisas que a gente não tem consciência que está repetindo, mas que se fazem presentes porque são formas de obtenção de prazer.

O que o Freud está nos dizendo quando ele propõe essa ideia? Aquilo que desde lá de meta a gente anuncia, ainda que é só agora a gente vai abrir com mais profundidade, que é a ideia de que a transferência é um retorno do recalcado. O que isso quer dizer?

Que a transferência é uma via de satisfação dos desejos infantis, que a transferência é um caminho por meio do qual a gente vai buscar satisfação e a gente vai encontrar prazer. O que ele segue, então, dizendo? Que essas mesmas estratégias de prazer, esses mesmos clichês vão se fazer presentes quando de uma nova relação, que é uma relação terapêutica. Então, o que é a transferência? A transferência é quando esses clichês se repetem.

Lá na figura, com a figura, o Freud vai trabalhar com a ideia do médico, a gente pode pensar que a ideia é do psicoterapeuta, do analista, não porque ela é exclusiva da terapia, da análise, a gente já vai falar disso, mas porque lá no campo do processo psicanalítico, do processo de escuta, Vem alguém que se oferece para ser objeto das nossas catexias, objeto dos nossos investimentos. Catexia é sinônimo de investimento, então quando ele está falando de catexia libidinal, ele está falando de investimento de libido, de investimento de sexualidade, portanto. Então, quando vem um novo objeto na nossa vida, ele se oferta para ser também alvo das nossas catexias, dos nossos investimentos de libido. E ele se oferta, portanto, para ser um objeto por meio do qual a gente vai repetir os nossos clichês. O que isso quer dizer?

Isso quer dizer que com esses novos objetos, vamos pensar, por exemplo, na figura do analista, a gente vai repetir essas formas de funcionamento infantil que, desde quando surgiram, são intensas o suficiente para se tornarem clichês. Então, o que a gente vai repetir? A gente vai repetir aquilo que são os clichês da consciência, mas principalmente a gente vai repetir esses clichês que foram recalcados e que são formas de prazer infantil, que precisam encontrar formas substitutas para acontecer.

Então reparem que o que o Freud está propondo é que quando entra um novo objeto na vida do sujeito, por exemplo, um analista que se propõe a escutar, Ele está se ofertando para ser um objeto substituto. E o psiquismo do sujeito vai usar esse objeto substituto para repetir clichê. Dito em bom português, vai aproveitar, entre aspas, esse novo objeto disponível para que ele possa repetir o seu jeito de ser, para que ele possa repetir a sua forma de ter prazer. para que ele possa encontrar mais uma oportunidade de satisfação pulsional.

Daí decorre duas questões, que o Freud então vai trazer dois pontos de interesse para os psicanalistas quando eles se ocupam do tema da transferência. Ele vai fazer a primeira pergunta, será que a transferência é mais intensa nos indivíduos neuróticos em análise do que em pessoas desse tipo que não estão sendo analisadas? E aí o Freud vai trazer um elemento, ainda que a gente não vai trabalhar aqui com o conceito de neurose e o conceito de neurose vai ser um conceito que vocês vão aprofundar no outro semestre de psicopatologia, mas a gente já pode pensar que o neurótico é aquele que não acessou a genitalidade e que, portanto, segue numa vigência de sexualidade infantil.

Então, segue encontrando no retorno recalcado a sua principal forma de prazer, porque não acessou um prazer genital. Mas o que nos importa mesmo é o que o Freud responde no sentido de a transferência não é... uma situação artificial produzida pela condição de escutar. Na verdade, todos os sujeitos fazem transferência a todo tempo. Em que sentido?

No sentido de que a gente aproveita os objetos da nossa vida atual pra com eles repetir prazeres que a gente ainda não abriu mão ou que são prioritários na nossa economia sexual. Então, a transferência não é uma invenção humana. da escuta psicanalítica ou da psicanálise, ela se passa em todas as nossas relações.

Na verdade, isso que a gente repete com as pessoas poderia ser chamado de transferência. Por que não é? Para que a gente possa usar o termo transferência para falar exclusivamente da relação terapêutica.

Terapêutica, lembrem, não no sentido estrito do consultório, mas no sentido da escuta. Então, quando... a gente estabelece uma relação com alguém que nos escuta e essa relação visa a mudança de alguma forma, essa ligação que a gente estabelece com quem nos escuta e que se oferta para ser objeto do nosso investimento, vai ser chamado por nós transferencial. As outras repetições que a gente faz com os objetos da nossa vida cotidiana, os nossos amigos, pessoas que a gente passa a se relacionar, essas... se chamam repetição.

Então, a gente está usando só um nome particular para delimitar a transferência como um fenômeno da técnica, como um fenômeno, então, de uma situação que visa a intervenção e, portanto, a mudança. Mas reparem que o que o Freud está dizendo é que essa repetição não é exclusiva dessa ligação aí. É porque a gente transfere a todo tempo, é porque a gente repete a todo tempo com novos objetos, que a gente pode entender que essa repetição também se passa na relação de escuta entre o sujeito e o psicanalista que se propõe a escutá-lo.

E aí o Freud traz, então, uma segunda questão, que é por que na análise a transferência surge como a resistência mais poderosa ao tratamento, enquanto que fora dela ela deve ser encarada como um veículo de cura e uma condição de sucesso? E aqui tem o elemento mais importante para a gente, mais importante de todos, que é um raciocínio que a gente vai começar a construir agora e que vai nos acompanhar ao longo do semestre, porque é o raciocínio que sustenta a intervenção psicanalítica. Quando a gente fala em retorno do recalcado, o que a gente está dizendo é que, mesmo de uma forma substitutiva, disfarçada, aparentemente nova, o desejo que ali se satisfaz não é novo.

É antigo, tá lá recalcado, tá fora da consciência, mas segue vigente. E isso significa uma forma de repetir um prazer que pela sua intensidade ainda não foi renunciado. Então a gente tá falando de um prazer infantil que insiste em acontecer.

Nesse sentido, a gente pode sempre associar a ideia da transferência... e dessa repetição que a gente faz com a figura de quem nos escuta, com a figura do analista, a gente pode associar a transferência à repetição. Porque o que a gente vai propor para um analista não é fazer algo novo, não do ponto de vista inconsciente.

O que a gente vai propor pela via da transferência é fazer mais do mesmo. O que a gente vai propor é repetir ainda esse prazer que a gente não renunciou. Então a transferência é uma forma de repetição, não uma forma de uma novidade.

Não uma forma de um jeito novo de se comportar. O que é importante nisso? Que se a gente propõe, mesmo que inconscientemente, porque nós não estamos falando aqui da consciência, se a gente propõe inconscientemente uma forma de repetir, a gente está abrindo espaço para mudar ou a gente está abrindo um caminho para ficar no mesmo jeito? Repetir a mesma coisa mais uma vez e ficar exatamente com os mesmos prazeres.

Toda vez que a gente falar em repetição, a gente está falando em continuar no mesmo lugar. Então, qual é o paradoxo? É que se por um lado a nossa consciência está buscando escuta, porque quer mudar, o inconsciente vai agir na direção oposta.

Ele vai agir na direção da manutenção dos seus prazeres infantis. O inconsciente não está aberto ao registro do tempo, ao registro da realidade externa, ao registro da lógica. Ele quer a satisfação dos seus prazeres e ponto.

Então, a transferência é uma forma inconsciente de repetir. E é por isso que ela vai se mostrar como resistência ao tratamento. Mais pra frente, a gente vai falar sobre resistência, a gente vai voltar à transferência.

Mas, por enquanto, já é fundamental que a gente pense que, à medida que a gente vai fazendo transferência, a gente vai fazendo transferência pra continuar com os mesmos prazeres. para continuar com as mesmas vias de satisfação, para continuar com as mesmas produções de prazer. E isso vai na direção oposta a mudar.

Aqui a gente pode começar já a responder a questão da abstinência. O que eu quero dizer com isso? A gente falava que para ter mudança, para poder escutar e intervir, o analista tem que ser abstinente. O que isso significa?

Significa que ele não pode se propor a repetir a economia psíquica sexual do seu paciente, do sujeito que ele escuta. Ele precisa entender qual é essa demanda transferencial para justamente não atendê-la. Então, eu preciso poder entender qual é a proposta de repetição que o sujeito me faz para justamente poder trabalhar com essa proposta e não repeti-la.

Porque se eu repetir com ele, ele vai continuar o mesmo, não vai ter mudança nenhuma. Então, o que o Freud vai propor? Que a investigação analítica faz com que a libido seja retirada do seu esconderijo, a gente pode pensar lá o seu prazer infantil. E, portanto, surge um combate na relação analítica, uma vez que a resistência tende a conservar o estado das coisas, tende a repetir. Para que a libido seja efetivamente liberado, é necessário acessar o material inconsciente.

E a resistência que acompanha o tratamento se dá passo a passo, a todo tempo. Cada sucessão isolada, cada ato da pessoa em tratamento, tem de levar em conta a resistência. E representa uma conciliação entre as forças que estão lutando no sentido do restabelecimento e as que se lhe opõem.

O que ele está querendo dizer com isso? Que a todo tempo a tarefa do analista é poder interpretar essa transferência exatamente para poder acessar o material inconsciente que está ali pela via da transferência tentando repetir, tentando permanecer o mesmo, tentando não se alterar. E que a única forma que a gente tem de efetivamente produzir mudança é acessar esse material inconsciente que tende a se repetir, que tende a se conservar. Então, se não houver o desvelamento, que é isso que a gente vem trabalhando lá desde o primeiro dia de aula como uma interpretação, o desvelamento, se não for possível trazer à luz o que é esse prazer infantil que segue buscando repetição, satisfação, as coisas nunca vão mudar. A repetição vai continuar acontecendo.

Reparem, pessoal, que quando a gente fala em satisfação infantil, a gente está falando do universo heterogêneo e infinito de prazeres infantis. A gente está falando, por exemplo, de uma satisfação narcísica de ficar sempre o umbigo do mundo. De uma satisfação anal de ficar controlando as coisas e de onipotentemente regular como as coisas se passam. de uma questão oral de confiança ou de apego ao outro, etc. Então, são esses conteúdos que precisam vir à luz por meio da repetição para que a gente possa efetivamente transformar a força do clichê e ele parar de ser tão prioritário, tão imponente de repetição.

Então, quando algo no material complexivo serve para ser transferido para a figura do médico, a transferência acontece. Então, quando a figura lá do psicanalista se oferece como um objeto possível para fazer o retorno recalcado, a transferência acontece. E essa transferência sempre se anuncia por sinais de resistência.

Então, o Freud vai trazer aqui o exemplo da interrupção e eu vou deixar para vocês ali no Mudo um vídeo do Dunker. em que ele conta o caso da Dora, porque foi exatamente assim que o Freud se viu diante da transferência pela primeira vez. Quando a Dora, uma paciente famosa na psicanálise e que apresentava um funcionamento histérico de conversão, e está em franco tratamento com o Freud, após produzir dois sonhos, chega um dia e diz que nunca mais vai voltar e faz uma interrupção que deixa o Freud absolutamente atônito.

Então... ele não tinha visto a transferência, ele se deu de cara com a resistência, a transferência estava por trás e ele não pôde enxergar, então é por isso que ele também está falando desse exemplo. Mas toda transferência, ela vai interromper a associação livre em uma medida, né?

Porque se a gente está dizendo que o objetivo de um tratamento é pela via da associação livre que a gente vai chegar no conteúdo traumático, a função resistencial é sempre interromper a associação. A transferência vai ser um desses caminhos de interrupção da associação. Então, a ideia transferencial penetra na consciência à frente de qualquer outra associação possível, exatamente porque ela satisfaz essa função resistencial, ela ocupa essa função resistencial. Então, ao repetir o sujeito não pensa, ao repetir o sujeito não associa mais coisas, ao repetir o sujeito fica exatamente onde ele está.

E aí o Freud segue dizendo, Quando nos aproximamos de um complexo patogênico, a parte desse complexo capaz de fazer transferência é empurrada em primeiro lugar para a consciência e é defendida com a maior obstinação, com a maior força, com a maior teimosia. Isso acontece para situar qual conflito vai ser combatido pela esfera da transferência. Ou seja, a transferência vai se colocar como resistência, como escudo.

como interferência para que a associação não chegue no conteúdo que é conflituoso. Então a gente transfere para se proteger de um acesso a algo que seria desorganizador, a algo que seria o que é o ponto de conflito, que é o ponto do conflito que produz adoecimento. E aí ele segue. Assim a transferência do tratamento analítico invariavelmente nos aparece desde o início como a arma mais forte de resistência.

E podemos concluir que a intensidade e persistência da transferência constituem efeito e expressão da resistência. O que ele está dizendo? Não é porque a gente quer olhar a transferência, não é porque a gente vai trabalhar com a transferência que a gente tem que se iludir que ela está a nosso favor.

Ela não está. Ela não está a favor da mudança. Ela está a favor da repetição. Então...

A gente vai encontrar formas de usar a transferência para acessar o mundo psíquico do sujeito, mas ela, por si só, é sempre expressão da resistência. E aí o Freud vai nos apresentar duas formas de entender ou de classificar a transferência. Uma que ele vai chamar transferência positiva e ele vai usar o positivo aqui como sinônimo de sentimentos afetuosos, amorosos.

E ele vai subdividir a transferência positiva em dois tipos. Um tipo de transferência sublimada, que são... sentimentos de afetuosidade, esses que são admitidos à consciência.

Lembram quando vocês trabalharam lá em psiquismo a ideia de sublimação e do quanto a sublimação permite que a gente transforme o investimento sexual em investimento afetivo, em investimento afetuoso, por exemplo, de amizade? Então, a transferência positiva sublimada... ela pode chegar à consciência. Então, a gente pode gostar de conversar com aquela pessoa que a gente decidiu conversar. A gente pode nutrir sentimentos benéficos pelo analista, a gente pode gostar daquele psicólogo que nos escuta e ter vontade de conversar com ele.

Mas existe também um outro tipo de transferência positiva, que aí sim não é da esfera da consciência e que o Freud vai chamar, então, de transferência erótica. A transferência erótica é quando a gente transfere elementos da vida sexual inconsciente sob a forma de desejo erótico à figura do psicanalista. A figura da transferência erótica é muito mais estimulante da resistência. Imaginem vocês, se vocês se apaixonam pelo analista, e o que vocês acham?

Se vocês se apaixonam por quem está escutando vocês, vocês não vão mais ter vontade ou se propor a contar o seu mundo psíquico. Vocês vão se propor a conquistar essa pessoa. Então, isso vai fazendo com que cada vez as condições de associação fiquem menores. Enquanto a transferência positiva sublimada é um motor, é um veículo, é um benefício à escuta, à relação de escuta, a transferência erótica é um malefício.

Ela é mais forte resistencialmente. E, além das transferências positivas, o Freud, então, vai conceituar as transferências negativas. As transferências negativas são aquelas pelas quais se dirige sentimentos hostis. Então, enquanto a transferência positiva tem a ver com o sentimento amoroso, com o investimento amoroso, a transferência negativa tem a ver com o investimento de hostilidade, que também é muito forte.

para funcionar resistencialmente. Então, eu não gosto daquela pessoa, não quero mais ver aquela pessoa, aquela pessoa me irrita, eu tenho ódio, e isso vai fazer com que eu fique muito mais longe de associar. Nas condições de resistência alta, a regra fundamental não se sustenta. Por isso que a gente vai ver mais para frente que a gente precisa trabalhar a resistência. A gente não pode deixar a resistência tomar conta, senão a regra fundamental cai, quebra, inexiste.

Então, na sequência, o Freud vai dizer, a transferência para o médico é apropriada para resistência ao tratamento apenas na medida em que se tratar de transferência negativa ou de transferência positiva de impulsos eróticos, né? É isso, impulsos eróticos recalcados. É isso que a gente está dizendo há pouco, né?

Fica muito viável resistir por essas duas vias transferenciais. E aí ele segue, se removermos a transferência por torná-la consciente, estamos desligando apenas da pessoa do médico aqueles dois componentes do ato emocional. O outro componente, admissível à consciência e irrepreensível, persiste, constituindo o veículo de sucesso da psicanálise exatamente como é em outros métodos de tratamento. O que ele quer dizer com isso?

Que a gente vai trabalhar para desfazer As transferências que se mostrarem como resistências. Então, a gente não vai mexer na transferência positiva sublimada. Essa a gente vai manter, essa a gente vai estimular. É fundamental que tenha aliança.

Mais pra frente a gente vai falar da aliança terapêutica, mas a gente já pode conceituá-la aqui como a transferência positiva sublimada. A gente quer estimular esse vínculo. amistoso, afetuoso, de ligação entre o sujeito e o psicanalista que escuta. A gente vai intervir, interpretar, dirimir, acabar, exatamente porque a gente interpretou, trouxe a luz e desmanchou o complexo, das transferências que são resistenciais, ou seja, as transferências negativas e as transferências eróticas.

É por isso que o Freud vai dizer que nas formas curáveis de psiconeurose, a transferência negativa é encontrada lado a lado com a afetuosa, e elas são dirigidas simultaneamente para a mesma pessoa. Isso significa vínculos de ambivalência. A gente sempre faz vínculos de ambivalência, pessoal, não é só na transferência.

Todas as nossas relações são ambivalentes. Para o Freud, isso acontece a partir da fase oral, quando o objeto começa não só a cuidar, mas também a frustrar. A ambivalência é presente constantemente nos nossos vínculos.

E aí ele vai dizer que ela é uma tendência emocional de todo sujeito, e aqui, claro, ele está falando dos neuróticos, né? Porque é aonde se dirige a psicanálise nesse momento. E a ambivalência é, então, a melhor explicação para a habilidade de colocar a experiência transferencial ou as repetições transferenciais a serviço da resistência. Aqui tem um ponto importante do Freud que se transformou ao longo do tempo e que a gente precisa marcar nesse texto para ele também se manter vigente.

Nesse momento, 1912, o Freud está escrevendo uma série de textos sobre a técnica. A gente, inclusive, chama esse conjunto de textos de escritos sobre a técnica. É uma época em que a psicanálise está em franco. avanço na Europa, muitas pessoas começam a praticar a psicanálise, surge a Associação Psicanalítica Internacional no sentido de tentar regular de alguma forma ou estabelecer parâmetros para a formação de um novo analista, é aqui que surge a ideia do tripé, a ideia da formação em psicanálise e o Freud começa a escrever esses textos para sistematizar a técnica, para que ela possa ser aplicada selvagemmente por qualquer pessoa, para que a gente não saia fazendo psicanálise selvagens por aí. Mas nesse momento, o Freud acreditava, e durante praticamente toda a vida, apesar de que lá depois de 1920, 18, 20, ele começa a se ocupar de patologias mais graves, mas nesse momento, principalmente, o Freud não acreditava que a psicanálise pudesse ser uma ferramenta terapêutica viável a outras estruturas que não neuróticas.

Então, para ele, ser um critério de analisabilidade. Só neuróticos se beneficiariam da psicanálise. E é por isso que a todo tempo no texto, vocês estão vendo ele falar em neuróticos, em psiconeurose. Psiconeurose para nós é sinônimo de neurose.

Porque ele entende que é uma ferramenta só para esse tipo de padecimento. Mais tarde isso se amplia, hoje a gente já não pensa mais assim. E é por isso que a gente tem que ler o Freud com essa ressalva. E aí ele segue, por exemplo, em estruturas cuja capacidade de transferência fica muito, muito mais intensamente.

Uma transferência negativa, como é, por exemplo, as situações dos sujeitos paranoides, paranoicos, fica muito mais difícil trabalhar a transferência e trabalhar com a ferramenta da psicanálise. O que nós estamos dizendo que é fundamental? Que a ferramenta da transferência é aquilo que sustenta... A ligação e as condições de escuta, as condições de regra fundamental.

Então, a gente precisa trabalhar a transferência para trabalhar esse campo de relação, que desde a primeira aula a gente está dizendo que é a condição para que o método aconteça, e trabalhar para que esse campo de relação se torne o menos resistencial possível, ou quando aparecer a resistência ela possa ser trabalhada, ultrapassada e o conflito possa ser elaborado. Nesse processo então de buscar o conteúdo inconsciente que está se satisfazendo por meio da transferência, a gente sempre vai se ver diante de um conteúdo inconsciente que está, portanto, obedecendo as leis do inconsciente. Então Freud vai dizer, por exemplo, da temporalidade.

Os impulsos inconscientes não desejam ser recordados da maneira pela qual o tratamento psicanalítico quer que eles sejam. Ao contrário, eles se esforçam para reproduzir o seu prazer na temporalidade, na ilogicidade, na ausência de contradição entre os conteúdos que são próprias do sistema inconsciente. Então, a gente vai começar a trabalhar aí na sequência.

Eu vou trazer essa lâmina também para vocês com a ideia do recortar, repetir, elaborar. Enquanto a gente está repetindo, a gente não recorda. Enquanto a gente está repetindo, a gente não acessa o mundo psíquico. Enquanto a gente está repetindo, a gente está parado no mesmo lugar.

E a gente precisa cessar a repetição para justamente poder acessar o mundo psíquico e entender o que está por trás daquela repetição. Então, a gente precisa interpretar a repetição para que ela... não aconteça mais e a gente possa entender que conteúdos estão por trás dela, ocasionando ela. E é nesse sentido que o Freud vai dizer que a gente precisa interpretar esses conteúdos, acessá-los, chegar até eles, poder conhecer o mundo psíquico e os conflitos do sujeito. Tal como acontecem os sonhos, o paciente encara os produtos do despertar, de seus impulsos inconscientes, como contemporâneos e reais.

Procura colocar suas paixões em ação sem levar em conta a situação real. Então, o sujeito não sabe que está fazendo transferência, o sujeito está vivendo aquele momento como se aquele momento fosse contemporâneo e não marcado pela temporalidade de um conteúdo infantil. Então, a situação que se presentifica na transferência é entendida como do aqui e do agora e não de um tempo anterior.

É a função do analista, é a função da escuta psicanalítica que vai permitir desvelar o que tem de repetição naquela situação que parece nova e contemporânea unicamente. De novo, o que nós estamos falando? Que é por isso que o analista, para poder ser abstinente e para poder escutar, precisa poder identificar as demandas transferenciais sem atendê-las.

Só assim ele vai poder cessar. o momento da repetição para poder acessar o mundo psíquico do sujeito. E aí o que o Freud vai dizer é que se trava uma luta constante entre o sujeito que produz a transferência e o psicanalista que escuta essa transferência. Exatamente porque o que ele quer, o analista, o que ele quer é acessar o conteúdo que está por trás da transferência. E é aí que o Freud vai dizer que é exatamente por ser uma repetição que a transferência nos presta um estimável serviço de nos trazer, de nos colocar diante de conteúdos imediatos e manifestos que estão propulsionados, que estão ocasionados, que estão originados em impulsos eróticos recalcados da sexualidade infantil do sujeito.

Então, ainda bem que acontece transferência, porque a transferência atualiza... os conteúdos infantis e inconsciente. Aí a gente tem ali uma brecha de acesso ao mundo psíquico do sujeito. Então reparem que por mais que ela seja uma resistência, ela é um recurso fantástico, porque ela abre a brecha para que a gente possa acessar o mundo psíquico do sujeito.

Mas como a gente pode fazer isso? Só se a gente não repetir a transferência. Senão a gente não abriu brecha nenhuma, a gente ficou onde estava.

A gente só vai abrir uma brecha que acessa o mundo psíquico do sujeito se a gente puder não atender à demanda transferencial. E por fim, o Freud vai então dizer, né, não se discute que controlar os fenômenos da transferência representa ao psicanalista as maiores dificuldades. Por quê? Porque é uma tendência constante do sujeito a repetir.

E é uma tendência constante do psicanalista de tentar escutar, identificar a transferência para não permitir que a repetição se dê. Muitas vezes a gente erra, muitas vezes a gente acaba atendendo a demandas transferenciais e o que isso faz é com que a resistência se fortaleça. E aí a gente tem que seguir trabalhando para poder dirimi-la depois. Mas não se deve esquecer que são precisamente esses fenômenos transferenciais que nos prestam o inestimável serviço de tornar imediatos e atuais e manifestos os impulsos eróticos e esquecidos do paciente. Pois quando tudo está dito e quando tudo está feito, é impossível destruir alguém em ausência.

A gente está então falando... do recurso, do instrumento viável que é para o psicanalista acessar a transferência, compreendê-la e aprender a trabalhar com ela. Trabalhar com ela é trabalhar a partir da brecha que ela nos abre para o mundo psíquico.

Não é atendê-la, repeti-la, fazer com que ela aconteça. Vocês me apontem aí se ficou claro a ideia. de que a transferência precisa ser entendida como um caminho de repetição e é exatamente possível, por isso que a gente não pode atender as demandas transferenciais.

Então, com isso a gente finaliza a compreensão da noção de abstinência, esse é um ponto importante, e a gente entende essa leitura do Freud de que a transferência é, ao mesmo tempo, uma resistência e um instrumento de trabalho. Assistam ao vídeo do Dunker, eu vou botar outras formas ali de transmissão, de vídeo sobre transferência. A gente vai, na sequência, falar dessa ideia do recordar, repetir, elaborar, antes de entrar na contratransferência, que é um outro elemento complicador desse processo. E a gente vai falando, então, nos nossos encontros no Zoom ou pelos links do fórum, tá?

Beijo para todo mundo, se cuidem!