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Constituição de 1988: Marcos e Impactos

Declaro promulgada o documento da liberdade, da dignidade, da democracia, da justiça. A Constituinte foi uma catarse. Se não fosse o Ulisses e o secretário-geral da mesa da Câmara naquela época, o Paulo Afonso, nós tínhamos botado fogo no Congresso. Foi um momento de ilusão.

Construímos uma democratização processual no Brasil. Eu era um militante considerado de esquerda. A gente tinha uma noção de que a gente estava mudando o país. A ideia era construir um país novo, um país democrático.

Era a criação de um novo Estado. Um momento de liberdade. Foi a última linha de produção de lideranças políticas do Brasil. No início da Constituição houve muitos embates físicos.

Muito tapa. O doutor Luiz sentava naquela cadeira, duas horas da tarde e saia às nove da noite. Não fazia nenhum pit stop para ir ao banheiro.

Lutei muito por uma constituinte, mas no sentido histórico da palavra. A promulgação da Constituição em 5 de outubro de 1988 simbolizou o fim de um período obscuro da história do país. Com a exaustão do regime militar e o processo de abertura política, os movimentos de resistência democrática se mobilizam na luta por direitos e garantias. A ideia de uma nova Constituição é incorporada pelas forças que elegeriam Tancredo Neves O primeiro presidente civil em 21 anos de ditadura.

Porém, a trágica morte do presidente eleito parecia o último obstáculo no caminho da Constituinte. Ao analisar a Constituinte de 88, nós temos que analisar que ela foi um fato político que tinha como geratriz um compromisso assumido. pela aliança democrática formada pelo PMDB e pelo PFL, em torno de alguns tópicos principais que eram fundamentais na transição democrática.

Esse compromisso com a nação, o pacto constitutivo, da Aliança Democrática, tornou possível eleger Tancredo Neves e José Sarney, presidente e vice-presidente da República, respectivamente, e, ao mesmo tempo, tornou possível a convocação da constituinte. Muitas pessoas falaram comigo naquele momento que nós não tínhamos ambiente para convocar uma constituinte. Nos anos seguintes ao golpe militar, o regime autoritário havia imposto profundas modificações Constituição de 1946, então vigente. Atos institucionais restringem direitos e garantias. Nos termos do artigo 2º e seus parágrafos do ato institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, fica decretado o recesso do Congresso Nacional a partir desta data.

A Constituição é a lei superior do país. No momento em que se diz, ela está em vigor, mas ela está limitada. ou pelas determinações do governo, não há mais Constituição.

Quando é que se justifica uma Constituinte? Quando está uma ruptura de uma ordem, ou a inauguração de uma nova ordem. No nosso caso foi muito especial, porque não houve propriamente a ruptura de uma ordem. Nós queríamos que tivesse havido a ruptura de uma ordem. Uns foram para a luta armada, outros achavam que o caminho era por dentro, outros ficaram à margem.

Nós não tivemos um grande evento para discutir. determinar a Constituição de 88. Nós tivemos uma retirada militar bem planejada, com uma característica muito clara. Ela tinha suas metas lenta, gradual e segura, sem alterar a estrutura de poder anterior. Nós queríamos uma ruptura profunda, mas uma ruptura com paz, sem guerra civil, sem violência. teve todas as virtudes de uma revolução.

Ela rompeu com o passado e ela encaricou. O país para adiante. Foi um processo que não foi de ruptura, mas que implicou uma mudança. E é dif��cil entender isso, até intelectualmente, porque todo mundo se fala, vai ter a ruptura.

Não teve. Então não vai mudar. Foi danado. Mudou.

Quatro meses após a sua posse, o presidente Sarney envia uma emenda constitucional ao Congresso, convocando a Assembleia Nacional Constituinte. A emenda determinava que os parlamentares eleitos em 19... 1986, seriam responsáveis pela elaboração da nova Carta Magna do país.

Havia pré-configurações determinadas pela própria emenda de convocação, que foi de iniciativa do Executivo e que optou pela estratégia do projeto conservador, no sentido de convocar uma constituinte congressual, portanto entregar a representação ordinária, a decisão extraordinária e a decisão de um governo. e fazer uma nova Constituição. Ela foi uma Constituição muito estranha, porque primeiro tinha uma discussão, é soberana ou não é soberana, é independente ou não é independente, é exclusiva ou não é exclusiva. Não foi, não foi exclusiva, foi dentro da regra da eleição, portanto, dentro do regime, de alguma maneira. O presidente Cesar Ney constituiu uma comissão de juristas para oferecer à constituinte algo já perfeito e acabado.

A comissão era composta de maioria de conservadores. E, no entanto, saiu dela um projeto bastante progressista. Foi um projeto extremamente avançado para a época.

E este esboço da Comissão Afonso Arinos eu... documento mais copiado e menos citado do Brasil. Só que a Comissão Arinos, o pessoal não aceitava, os constituintes não queriam partir de um texto.

Eu tinha sido professor em 68, em 67, 68, na França, em Nanterre. Eu tinha Eu estava lá quando houve o movimento de maio, aquela coisa toda. A Constituinte me parecia Nanterre. É proibido proibir.

Todo mundo queria participar diretamente, ninguém aceitava opinião pré-escrita de sábios. Instalada a Assembleia Nacional Constituinte. Ao ser instalada em fevereiro de 1987, a Assembleia Nacional Constituinte elege Ulisses Guimarães presidente dos trabalhos e o principal condutor do processo. Quando o doutor Ulisses assume, ungido pela nação e pela imensa votação que teve dentro da Constituinte, como o representante primeiro da Constituinte, o presidente, e apresenta já o projeto de resolução de que nasceria o novo regimento, ele anuncia a expectativa de ver aquilo aprovado em uma semana.

Aquilo levou mais de 40 dias para ser aprovado. O Ulisses... que era um homem de rara inteligência, entendia que se podia criar uma comissão composta de 80 membros, nós éramos 500 e tantos, mas a grita foi enorme, porque aí os constituintes disseram, bom, mas os que são escolhidos dentre os 80 serão constituintes de primeira classe, e os outros serão de segunda classe.

Nós começamos com 24 subcomissões, agrupadas 3 a 3 em 8 comissões temáticas, que devem fazer audiência. ouvindo as respectivas setores populares interessados naquele tópico. E depois, alto no topo, tinha uma comissão chamada de sistematização.

Essa comissão é que iria sistematizar os trabalhos das outras, mas que caberia ao relator o texto final, desde que ele tivesse seguido a orientação das comissões temáticas. Ela começa solta. começa de um modo indutivo, de baixo para cima.

A necessidade de fazer um processo constituinte em que os 559 constituintes estivessem em vez fez com que se adotasse um procedimento extremamente ousado, de começar do zero, a partir da identificação de quais seriam os 24 temas que deveriam figurar na Constituição brasileira a partir do que continham as Constituições anteriores no Brasil e as Constituições atuais. na Europa e na América do Norte, no Terceiro Mundo. Determinado tema, integrará ou não integrará o futuro texto da Constituição?

Tributação e orçamento, educação, saúde, previdência, organização do Estado, organização dos poderes. Se forma uma subcomissão sobre o tema, está garantido que vai integrar. A Assembleia Nacional Constituinte transforma o Congresso no centro das principais decisões políticas do país.

e Brasília, no ponto de convergência das principais demandas da sociedade brasileira. Quando chegou a Constituinte, o Congresso virou um mercado de persa, todo mundo ia para lá. Era uma coisa notável, porque os corredores do Congresso...

fervilhavam de pessoas. Nós tínhamos milhares de pessoas diariamente no Congresso, nos corredores, nos gabinetes, levando papéis, levando pareceres, levando opiniões, as galerias cheias. Eram entidades que tinham devolução àquela causa que ela se defendia, fossem elas ligadas à mulher, ao deficiente físico, à criança, o adolescente, ao idoso. O sindicato trazia a sua suas propostas, o Ministério Público trazia sua proposta, o Judiciário trazia suas propostas, a indústria, o comércio, a agricultura. Você deu a palavra para representantes mais diversos da sociedade brasileira.

Tinha garimpeiro, tinha sem terra, tinha com terra, tinha banqueiro, tinha bancário. Tinha índios, operários, você tinha de tudo ali procurando buscar a realização dos seus direitos. Era a organização de prostituta, era a organização de menino e menina de rua, era a organização, as mais variadas de setores normalmente desorganizados em qualquer sociedade. E aqui eles apareceram, vieram depor.

Os ambientalistas foram ao Congresso Nacional, foram a Constituinte. Nós fizemos algumas manifestações, colocamos uma baleia no topo do Senado. Você imagina os 40, 50 indígenas cantando no gabinete do Ulisses Quimarães. Nós colocamos um cocar na cabeça dele.

O regimento interno da Constituinte abriu a possibilidade para a sociedade participar do processo, apresentando emendas populares. Na hora de fazer o regimento, nós entramos com esta ideia que tinha surgido no Fórum Pró-Participação Popular da Constituinte, uma coisa que a Igreja inventou e que teve um bruto efeito antes da eleição. E nós tivemos vários...

vários instrumentos, vários mecanismos de diálogo com o processo constituinte. Nós temos, inclusive, uma frase que a gente usava, que era constituinte sem povo não cria nada de novo, que era uma reação a essa hipótese de fazer uma Constituinte de cima para baixo, por gente que entende de Brasil, que entende de leis e vai dizer como deve ser o Brasil futuro. O SEAC foi uma união de várias entidades da sociedade civil que foram ao ANB e propuseram ao então reitor, que hoje é o senador Cristóvão Buarque, esse trabalho na Constituinte para que os trabalhadores pudessem ter acesso a tudo o que acontecia na Constituinte.

Nós participamos muito do trabalho. do trabalho sobre as emendas populares, especialmente. Tanto na sua viabilização, no aconselhamento às entidades que queriam promovê-las, quanto na discussão de textos técnicos.

Esses plenários começaram a divulgar a possibilidade. E aí começaram a nascer propostas no Brasil inteiro. E essas propostas foram acumulando assinaturas.

As pessoas tinham que assinar, segundo a regra estabelecida no regimento interno, no máximo três. Não podiam assinar mais do que três. Tinha que ter no mínimo 30 mil, tinha que ser de cinco estados, mil complicações. a possibilidade de emenda popular, trabalhou em torno de algumas temáticas. Primeiro, a questão indígena e a questão rural, em prol da reforma agrária.

Nós tínhamos as reivindicações também do movimento negro. A questão das cotas foi falada na Constituinte. Nós conseguimos naquela época que o crime de racismo virasse crime inafiançável. Na área da criança e do adolescente tinha uma mobilização muito forte no país inteiro. Cheguei a receber uma emenda popular com mais de um milhão de assinaturas, favorecendo as crianças e adolescentes, o que depois se transformaria no próprio estatuto da criança.

crianças do adolescente. No âmbito dos jornalistas, nós estávamos muito empenhados em defender a democratização dos meios de comunicação em nosso país. Fiel à tradição da esquerda.

Eu só dava atenção ao trabalhador da ativa, que podia fazer greve, parar, fazer confusão em movimento e não ligar muito para os aposentados. Eu passei a ligar para os aposentados pela pressão dos próprios aposentados ali na minha audiência popular. Assumi, fiz emendas a favor dos aposentados e comecei a me preocupar, a votar e articular a defesa dos aposentados.

A dimensão de cidadania é de consulência. No processo constituinte, essa matéria vem pelas audiências, toma corpo, tem propostas a respeito e a constituinte decide que o Congresso Nacional tem um prazo para elaborar um código do direito do consumidor. Uma das conquistas desse processo foi exatamente garantir que a emenda popular se transformasse em item da Constituição.

E ela se transformou sob a forma de iniciativa popular de lei. E essas emendas populares foram entregues sob a coordenação do Luciano Mendes, que era o então presidente da CNBB, já no período, e foram entregues oficialmente lá no Congresso Nacional ao Liceu Guimarães. Quando chegamos aqui no dia da entrega final, todo mundo veio trazer as emendas, eram 122, do Brasil inteiro.

E o total de assinaturas é inacreditável. Chegamos a 12 milhões de assinaturas. Mais de 50% delas, portanto a maioria delas, recebeu o aproveitamento, seja total ou parcial.

Ele tem o sonho do Brasil. Todo mundo levantou ideias, todo mundo fez propostas. Coisa muito rica, muito rica. Nas eleições de 1986, o PMDB teve uma grande vitória. Conquistou maioria na Câmara dos Deputados e no Senado.

e garantiu ao partido os principais postos de comando da constituinte. Tem início uma longa disputa de poder e influência, que resultou em seguidas tensões entre o Congresso e o Palácio do Planalto. Eu fui um grande crítico da constituinte. Eu achava que eu ia presidir um processo no qual nós íamos fazer uma grande constituição.

Se o poder, o governo estava comigo, mas o poder político estava com o Luiz Guimarães. Essa era a grande coisa que existia naquele tempo. O primeiro período do governo Sarney tem uma hegemonia muito grande, doutor Ulisses, ao ponto de vetar ministro.

Ele vive esses primeiros momentos sem nenhuma desenvoltura naquele papel que lhe caiu de repente. O Sarney tinha que estar ali envergonhado, porque até pouco tempo atrás... Ele era o principal opositor desse partido do MDB, ele era o contraponto do MDB, ele era o presidente do partido da ditadura.

Eu tinha noção de que nós estávamos vivendo, pisando sobre ovos naquele momento. E havia, primeiro, a necessidade de eu buscar a minha legitimidade, que aconteceu com o plano cruzado. Brasileiros e brasileiras. As principais decisões são as seguintes Criação de uma nova moeda, o Cruzado Congelamento total de preços, tarifas e serviços Em segundo lugar, eu tinha que realmente ter noção de que as únicas forças organizadas que tinham no país naquele momento eram as Forças Armadas. forte.

O presidente Sarney estava fazendo o melhor que podia, porque tinha substituído o nosso Tancredo, que eu estou convencido, jamais teria feito a Constituinte. Tancredo com aquela sapiência dele, aquele jeitinho dele, teria feito um rebendão que já estava pronto. O doutor Ulisses era aquela coisa, a constituinte sou eu. Ele tinha na cabeça dele o projeto de ser candidato a presidência.

da República e a Constituição seria o carro-chefe dele para essa campanha. A política partidária invadiu a Constituinte. Invadiu a Constituinte não pensando em fazer uma Constituição.

Mas na realidade, já pensando na eleição para presidente da República. O presidente Sarney, no pronunciamento de televisão, extravasou a sua preocupação e, sobretudo, a sua insatisfação com todas aquelas matérias que se discutiam na ocasião e que poderiam gerar maiores dificuldades para o exercício do poder executivo. O macoste print dá vida.

trabalhar mais com o futuro do que com o presente. Ela deve ser capaz de construir um arcabouço jurídico capaz de livrar a nação de abalos institucionais. O Sarney dizia que a constituinte ia tornar o Brasil ingovernável. E o embate político dele com o doutor Ulisses era nessa questão da governabilidade do país.

Depois da promulgação da chamada Constituição Cidadã do Ulisses Guimarães. Temor de que o presidente Ulisses, que era presidente da Câmara, era presidente da Constituinte, era presidente do PMDB e era, eventualmente, presidente da República... Se a gente fizesse uma constituição ali da turma do Poir, faz com que uma outra surpresa aconteça logo em seguida, a elaboração do regimento, que é a eleição do Mário Covas pela bancada do PMDB.

como líder do PMDB na Constituinte. Ele foi eleito como um ato de rebeldia, inclusive dos conservadores do PMDB, contra o doutor Ulisses. O acordo que o Covas faz com os demais partidos permite que os progressistas ocupem posições muito importantes no processo. Na organização dos poderes, a relatoria do sistema de governo coube a mim.

Eu fui, então, trabalhar em duas questões. O regime de governo, presidencialismo ou parlamentarismo e o período de mandato do presidente da República. Como fazer com o presidente José Sarney?

Dar-lhe os cinco anos e estabelecer... estabelecer quatro anos para os presidentes seguintes, ou já estabelecer, desde logo, que o mandato do próprio presidente Sarney teria só quatro anos. Passada aquela fase em que o Lícius mandou muito, o Sarney foi reconquistando força.

E ele foi conquistando base aqui dentro, quando ficou claro que a Constituinte caminhava para parlamentarismo quatro anos. O Sarney, na verdade, foi eleito por seis, mas nós queríamos quatro, porque era... era a tradição, e parlamentarismo.

Por causa do Mário Covas não foi possível um acordo com o Sarney para fazer cinco anos de parlamentarismo. O Covas era muito irredutível nos quatro anos. Ulisses também, mas menos. O Mário era bastante.

Ele não era tão irredutível nos quatro desde que houvesse parlamentarismo. Se vota quatro anos, o presidente renuncia, ele já é vice, não tem vice. Vai ser obrigado a chamar o presidente da Câmara e dentro de 30 dias fazer uma lição. Esse era o texto constitucional. E o Brizola ganha.

Nós vamos para o retrocesso. A minha convicção poderia ser até quatro anos. Mas a responsabilidade era o retrocesso. Então eu fui defender 5 anos. Eu tinha 6, abdiquei de 1 e passei naquele tempo todo a imprensa discutindo que eu estava querendo mais um ano de mandato, que eu tinha direito a 4 anos.

O projeto vindo das subcomissões e das comissões tinha que passar pela... Só que a sistematização se enrolou, se complicou, deu um nó político. E nós tínhamos a seguinte situação, x deputados, 50 e poucos trabalhando na sistematização, e os outros constituintes, senadores, deputados, sem o que fazer. Um mês, dois meses, criou uma tensão enorme.

Essa comissão de sistematização, ela tinha o poder de votar artigos da Constituição, esses artigos, com qualquer coro, ela se reunia e votava. Uma vez votada pela Comissão de Sistematização, só podia ser derrubada pelo plenário por dois terços. Nove meses depois, quase a maioria conservadora desperta dentro da Constituinte, é o chamado centrão que surge para desfazer o regimento e permitir zerar o processo e começar o jogo de novo.

O governo se organizou porque perdeu na Comissão de Sistematização. E viu que ia perder em muitas coisas. Então criou o Centrão, que era um movimento, digamos, de reação ao setor mais progressista da Constituinte.

Então, o que mais uniu o Centrão foi a mudança regimental, foi tirar os poderes da sistematização, o que aconteceu. E nisso eles vieram de rolo compressor e atropelaram, e era uma rebeldia majoritária que teve que ser aceita. A alteração no regimento foi fundamental para que o presidente José Sarney garantisse cinco anos de mandato e também foi decisiva para a definição do sistema de governo adotado pelo país. Havia uma dúvida muito forte com relação à maior conveniência para o regime a comandar o país, se seria o presidencialista ou se seria o parlamentarista. Naquela altura...

O Ulisses era presidencialista e era candidato a presidente da república. O PT, apesar do Lula, que era constituinte, ter simpatia forte pelo parlamentarismo, mas o PT defendia... o presidencialismo.

Lutamos muito por eleição direta para presidente. Foi a luta que antecedeu a constituinte. A base do meu partido era formada na luta pela eleição direta para você poder escolher o presidente da república, quem mandava no país, entre aspas.

Então as forças se organizaram. O Zornei, na presidência da república, contou com uma atuação de ministros de Estado, que se diziam naquela altura, e que houve até distribuição de emissoras de televisão, de rádio, fazendo... O Tomará-Daká talvez tenha sido nessa altura que se inaugurou essa história do Tomará-Daká e derrubaram.

A constituinte foi feita no pressuposto de que o regime seria parlamentarista e ao final o regime escolhido pela maioria do Congresso foi o regime presidencialista. Ela criou um sistema híbrido. O país não é nem parlamentarista, nem o país é presidencialista. O resultado disso é que nós passamos a conviver nesses 20 anos com um executivo que legisla e com um legislativo que teve o sonho de ser executivo e que também não conseguiu agregar esses poderes que ele mesmo incorporou, porque passaram a ser feitos através das medidas provisórias que vieram para o Congresso durante esse tempo todo.

Apesar das disputas políticas internas, a Assembleia Nacional Constituinte incluiu na nova carta instrumentos de transformação social e resgate da cidadania para milhões de brasileiros. O artigo 7º, que traz os direitos dos trabalhadores, ele já traz também muita reivindicação que os... Os dirigentes sindicais, de alguma forma, colocaram na Constituição praticamente uma lista de direitos, alguns até agora não conquistados. Um momento para mim que é importante foi na questão do direito de greve.

E chegou um momento que o Covas, me lembro que fosse hoje o Lula, disse olha, para esse texto passar, quem vai ter que defender é você, Jarbas Passaguinho. Eu fiz a defesa da greve. E consegui quase 90% de aprovação.

Nós começamos a fazer uma campanha nacional, sobretudo a partir do ABC, pela redução da jornada de trabalho para 44 horas semanais. A gente começou a trabalhar nessa reivindicação três anos antes da Constituinte e na Constituinte conseguimos de uma vez só reduzir de 48 para 44. O aviso prévio, a questão das fegas mais um terço, a própria liberdade e autonomia sindical. A questão, por exemplo, da licença paternidade, que era uma novidade, só os suecos tinham essas coisas.

A multa de 40% no ato da demissão. Já dificultava, não era estabilidade, pelo menos já dificultava os empresários a demitirem. O salário mínimo capaz de satisfazer as necessidades, e aí bota todas as necessidades dos trabalhadores de sua família, nacionalmente unificada, etc, etc, que não pode ser vinda de indexador.

E ufa! Fundo de Amparo ao Trabalhador, que está previsto na Constituição, financiando o seguro-desemprego, que nunca mais teve problema de financiamento. O serviço público não tinha absolutamente nada, não podia nem criar sindicato. Pela concepção do Estado...

e de quem dominou o Estado nesse período, o servidor público não tem patrão. Então, como ele não tem patrão, não tem contradição. Não tem contradição para que greve, para que sindicato.

Claro que com o processo de modernização, democratização, se criou o sindicato. Porque eu não saía de Brasília. Nós estávamos a todo momento conversando com os deputados, com o relator, que era o Bernardo Cabral, na ocasião, nós conversávamos com todo mundo, mas nós não falávamos.

Não falávamos só de reivindicações trabalhistas. Nós estávamos, sim, preocupados com a constituinte como um todo. Muitas vezes a discussão com meus companheiros da Fiesp, da CNI, eu tinha muitas vezes dificuldades nas negociações, porque também alguns líderes sindicais e alguns líderes partidários muitas vezes tinham propostas mais diferenciadas, mais radicais, e isso dificultava, mesmo eu sendo homem, tolerar.

conselhador, mas tive muitas dificuldades nessas negociações. No entanto, na maioria delas, nós tivemos realmente resultados e alcançamos êxito. Se o parlamento hoje trabalhasse... Só na regulamentação daquilo que ficou para regulamentar na Constituinte, já tinha trabalho de sobra.

88 era um ano eleitoral, tinha eleição municipal no país inteiro. Os deputados da direita sumiram do plenário e foram fazer eleição. Isto nos dava uma vantagem competitiva enorme. Na hora da negociação de liderança, a gente dizia, se não passar isso pelo menos, a gente estoura a sessão. Então nós fomos conseguindo...

Um montão de vantagens. Já viu os placares que as centrais sindicais espalhavam pelas praças e ruas do país em outdoor? Vejam quem votou assim, vejam quem votou assim. Isso era um peso fundamental. Eu ganhei muito voto, muito voto, de negociar a cara do sujeito na terra.

Um dizia assim para mim, tá bom, eu não posso votar com vocês, eu vou votar contra, mas faz uma coisa, Plínio, essa outra aqui que você quer, eu voto, mas desde que vocês não põem no outdoor, pelo menos na minha cidade. O DIAP jogou um papel fundamental, porque o DIAP também já foi dando nota para os constituintes, que tinham posições mais avançadas e as posições consideradas por nós mais conservadoras. Saúde, Previdência e Assistência Social. tiveram avanços significativos na Constituinte. Existe um movimento já nacional no sentido de criar um sistema diferente de atendimento à saúde.

Era a área que tinha mais... Clareza do que queria e de como deveria ser feita uma reforma no Estado brasileiro para se avançar numa política social. E aí veio a grande proposta da reforma sanitária, com pressão de todos os profissionais de saúde engajados nesse momento político dentro do Congresso Nacional para que então se estabelecesse o Sistema Único de Saúde.

Nenhuma outra área de política pública fez uma reforma tão profunda como essa. Acabou se demonstrando como, talvez, se não o maior, um dos maiores projetos de inclusão social do país. Quer dizer, a gente reclama que não está bem, que as coisas não vão bem, etc.

Mas esse projeto incluiu todo mundo. no sistema de saúde. Apesar de mal financiado, atendeu no ano passado, 2007, os brasileiros mais de 4 bilhões de vezes.

Isso praticamente num país tão desigual como o Brasil, isso é quase uma... revolução social em termos de proposta. E essa reforma andou. Aqui tem um artigo que diz o seguinte, quem trabalhou na roça, no seu sitioca, para comer e para vender alguma coisa, E não pagou o INSS, nem sabia que existia o INSS. Tem direito a um salário mínimo.

O estudo do ITEA demonstrou que só não teve uma crise séria de fome em 94, porque os velhinhos receberam um salário mínimo. E isso mudou a configuração e mudou o papel do velho na família do Nordeste. Ele deixou de ser um perigo.

e virou um valor. Teve uma medida que pareceu, assim, estar num inciso, que deve ter uma linha, que diz o menor benefício de prestação continuada na área da previdência, da seguridade social, nunca será inferior ao mínimo, ao salário mínimo. Mas muitos já eram, então teve uma elevação geral. O movimento de mulheres, representado por diversas organizações, entre elas o Conselho Nacional de Direitos da Mulher, e o Cefêmia apresentou suas emendas e também obteve conquistas. Nós construímos uma campanha que se chamou Constituinte para Valer tem que ter direitos da mulher.

E passamos então a receber no Conselho Nacional uma série de propostas. Esse trabalho longo... Teve o nome de Lobby do Batom.

Aqui em Brasília teve um grande encontro, o Encontro Nacional Mulher e Constituinte, onde tiramos a carta das mulheres aos constituintes. E 80% das nossas reivindicações foram atendidas. Você efetivamente escreveu que os homens e as mulheres têm direitos iguais, são iguais perante a lei.

Então o pátrio-poder não existe mais, né? O conceito de família, de ampliação de família, foi uma conquista imensa. Eu, por exemplo, que sou mãe solteira de quatro filhos, fui virar família. Depois da constituinte, antes eu não era.

Para você ser família, você tinha que ter a figura masculina e feminina, e não só um pai com os filhos, uma mãe com os filhos, não era família. Mas as mulheres rurais conseguiram uma grande conquista, que foi o direito à titularidade da terra. Antigamente, mulher não podia ser dona em terra rural, então a constituinte trouxe isso.

E, muito importante, porque muito, muito, muito avançado, a licença à paternidade. Todo mundo ria da minha emenda da licença de paternidade e diziam que era coisa de índio. E havia um lobby empresarial fortíssimo para que ela não fosse aprovada.

Minha mulher estava grávida, nasceu minha filha no dia 14 de dezembro. E ela não foi bem de parto. Eu não consegui dormir, porque... E... Minha filha chorava à noite, recém-nascida, e minha mulher não conseguia atendê-la.

E eu fiquei de pai e babá, e enfermeiro da menininha e da mulher. Vim para Constituinte táxi, para chegar embaixo do plenário, na chapelaria. E ao entrar no plenário, a deputada Rita Camata estava sendo aplaudida de pé, tinha acabado de aprovar a licença maternidade.

E não cheguei a cumprimentá-la porque Ulisses fez uma jocosidade, fez uma piada a respeito da minha emenda que se... seria a seguinte, plenário inteiro caiu no riso e eu me incomodei. E fui me dirigindo a ele para tomar uma satisfação da piada, quando ele fez outra piada.

Eu resolvi subir à tribuna, mesmo não estando escrito, sabendo que o Ulisses ia me caçar a palavra, comecei a contar histórias de mães que tinham morrido na sala de parto em que eu estava presente como pediatra. Minha dificuldade é para dizer para o pai que ele tinha perdido a mulher e ganhou um filho, e o que aconteceu? Acontecia sempre com o pai depois. O pai optava pela família e, geralmente, perdia o emprego. Olhei para o Ulisses Guimarães, vi que ele estava emocionado também e disse, Vossa Excelência perguntou por onde eu andava esses dias.

Estava cuidando da minha família. Reaprendi a brincar, reaprendi a cantar, reaprendi a dançar, reaprendi a ser gente. E essa, senhor presidente, é uma emenda séria, vigente. E desci e chorei também. O plenário inteiro chorava.

Aprovei com 300... 287 votos contra, uns poucos votos contra. A presença dos índios na Constituinte foi marcante e assegurou um capítulo especial na Constituição dedicado aos direitos indígenas. Um dos temas mais polêmicos foi a demarcação de terras.

Como é que se vai definir o que é a área indígena? Primeiro foi preciso superar a resistência que se reconhecesse em direitos aos índios. E depois a questão da terra. E aí é que se consagrou uma fórmula que está lá na Constituição, que as terras indígenas pertencem ao patrimônio da União.

O índio não é proprietário. Porque se dizia isso, não, mas o índio não tem experiência, ele vai ser enganado, ele vende a sua terra. Não, então ele não é proprietário.

O proprietário é a União. Mas ficou assegurada ao índio a ocupação permanente. Permanente do quê?

Aí também houve uma grande discussão, o que é área indígena? São aquelas tradicionalmente ocupadas por grupos indígenas. E é isso que está na Constituição.

Então hoje, os povos indígenas estão ficando cada vez mais preparados para exercitar essa organização social que a Constituição manda respeitar. Uma inovação da Constituinte. foi dedicar tratamento especial ao meio ambiente.

A Constituição de 88 é um marco divisor fundamental na questão ambiental no Brasil. Havia muita polêmica, inclusive, se deveria ou não constar alguma coisa sobre o meio ambiente, porque muitos juristas diziam que essa não era matéria constitucional. E daí nós começamos um trabalho muito interessante, que foi formar a frente...

Verde no Congresso Nacional. Poucas áreas foram tão importantes do ponto de vista instrumental como nós tivemos no capítulo de meio ambiente. Quer dizer, ele permitiu os avanços, ele amparou concretamente as demandas judiciais, ele deu um outro...

para questões ambientais. O estudo de impacto ambiental é o que proporciona à sociedade discutir determinados projetos, determinadas iniciativas que antes da Constituição de 88 praticamente eram colocadas sem nenhuma discussão para a sociedade. Nós tivemos a discussão inclusive da bomba atômica brasileira.

Eu acho que a Constituição Brasileira ajudou muito, quer dizer, a consciência ambiental e inclusive os avanços que nós tivemos após a Constituição de 88. Quer dizer, a Constituição Brasileira, passados os 20 anos, ainda é considerada um modelo para os outros países. De forma cara, bem! De forma cara, bem!

Se não me de forma cara, o Brasil perde também! Um momento que foi um debate duro, de microfone sendo arrancado e... Empurrões e tapas, eu diria, no plenário do Congresso, foi no debate da reforma agrária.

No fundo, a discussão era um pouco sofisticada. Se podia desapropriar ou não terra produtiva. Quando é que pode ser desapropriada uma determinada área? A diferença entre a área rural e a área urbana. E aí houve uma participação forte dos grandes proprietários, impondo uma série de restrições que ainda houve.

Hoje estão na Constituição. Esse foi o pomo de discórdia. Depois nós acabamos contornando e dizendo que dependia da função social da propriedade.

Naqueles dias nós tivemos uma coisa inusitada no país, que foram a elite rural fazendo passeata para reivindicar os seus direitos. Ora, até então quem fazia passeata era o pobre, o operário. Quando eu vejo os ricos fazendo passeata para reivindicar os seus direitos, é porque alguma coisa está se modificando. Ao entrar em vigor, a Constituição já teve que enfrentar desafios.

O primeiro teste foi o da governabilidade. O presidente Sarney foi, na minha opinião, num ataque de lucidez, disse que com essa Constituição vai ser muito difícil se administrar o Brasil. Ele tinha razão. O município não acredita no Estado.

O Estado não acredita na União. Eu não acredito no governo nem quando estou nele. Tornou difícil governar, porque ela diminuiu muito os impostos da União. e transferiu para estados e municípios e não transferiu responsabilidades.

O que a União fez depois? Criou tributos, contribuições. Distorceu o sistema.

A Constituição criou despesas sem criar recursos. disso é que hoje quando nós falamos a carga tributária do Brasil é 40%. Quer dizer, na realidade naquele tempo era 23%.

E a própria, o país teve que começar a aumentar a carga tributária, que o povo terminou pagando. para cumprir aquelas coisas que na Constituição, na Constituinte, elas foram feitas. Não, eu acho que não ficou ingovernável até porque algumas coisas foram modificadas. Eu não diria que ficou ingovernável, ficou mais... complexo, isso sim.

Nós não temos instrumentos para o Estado se adequar ao mundo moderno. Isso foi feito depois, em parte no meu governo. As transformações no cenário externo foram o segundo desafio ao novo desenho do Estado brasileiro definido na Constituinte. Eu acho que aquele foi um momento muito importante do Brasil como país, como nação, para começar a sacudir os vários grupos sociais a pensarem.

Era um momento em que o muro de Berlim não tinha caído, portanto, muita gente tinha uma visão anticapitalista, ou pelo menos, menos não capitalista. Era comum dizer, bom, o mundo caminha para o socialismo. O pessoal que comandou o PMDB, Ulisses, inclusive, Mário Covas, os que tínhamos uma noção mais equilibrada das coisas, a gente fazia um certo equilíbrio entre o centrão e as propostas mais radicais.

Foi o que prevaleceu na Constituição. Os progressistas, assim, na época, eram considerados aqueles que raciocinavam, que pensavam, que defendiam posições estatizantes, ou seja, que defendiam o Estado. bastante similar àquele que existia nos países do leste europeu. Com os que tínhamos influência no IMDB, nós éramos bastante ligados a uma visão nacional-estatista.

e com muita simpatia também por certo corporativismo. Eu não tinha tanto, mas outros tinham. A construção não era fácil, porque as tendências eram, por um lado, um nacional desenvolvimentismo estatizante, por outro lado, uma visão que podia ser até mais dinâmica do ponto de vista capitalista, mas bastante conservadora, a questão da propriedade, e por outro lado, alguns setores que eram radicalmente contra a ordem. Qualquer coisa que tocasse na propriedade privada era um escândalo. Nós não conseguimos romper essa barreira.

A Constituição brasileira, ela refletia um Brasil de antigamente, inclusive na política, estatizante, super nacionalista. Não é que tenha sido ultrapassada, é que o momento político do Brasil levava ao gigantismo do Estado, a valorização do Estado e a minimização na importância que isso deveria dar à iniciativa. privada e a capacidade da iniciativa privada de gerar ela por si só o desenvolvimento.

A esquerda perdeu o debate na sociedade por quê? Porque era exagero a intervenção do Estado. O Estado estava em setores em que não precisava mais estar.

Na parte econômica, a Constituição, durante algum período, ela trouxe um certo, ela alavancou um grau de atraso na economia brasileira. Esse país realmente não era um país organizado do ponto de vista econômico. Não tinha...

bases estruturais para crescimento sólido. Os anos 80 revelaram um momento para o país de muita dificuldade, tanto no fronte externo quanto interno. Externamente o país vivia com uma dívida externa muito alta, que era praticamente o principal problema da nossa economia e tinha inclusive repercussão sobre a situação interna, onde o principal problema...

O país internamente era a inflação, a qual, com vários planos econômicos, tanto nos anos 80 quanto, inclusive, nos 90, não conseguiram resolver. Plano Cruzado, Plano Bresser, Plano Collor, alguns funcionaram muito bem, alguns a sociedade recebeu muito bem, outros depois não deram certo. Então, tudo isso realmente mexeu. com o país, com a economia.

Isso também provocou algumas desconfianças no investidor estrangeiro aqui, no próprio investidor nacional. Somente quando o Brasil viveu um processo político democrático consistente, ele descobriu que pela via democrática a gente deve optar pela estabilidade econômica. Uma boa Constituição tem que ser, como as parábolas, das igrejas, várias interpretações, porque ele tem que se adaptar ao tempo.

Como é que um texto permanece? Se você faz uma coisa muito rígida, vai ser quebrado esse texto. Naquilo que a Constituição tinha de rígida, ela foi quebrada.

Monopólio, foram quebrados. porque não dava mais, ficou em contradição com o mundo atual. As reformas neoliberais, a quebra do monopólio do petróleo, das telecomunicações e de energia, não desconstituiu o papel indutor do poder público do Estado brasileiro.

De todas as construções da Terra, eu duvido que exista uma tão contrária ao neoliberalismo que essa. Essa construção começa por ser um objetivo fundamental, o Estado tem que fazer, é dever do Estado. Estado, são direitos do cidadão perante o Estado.

Portanto, ele é antítido neoliberalismo. Quando discutimos a Constituição, estava vivendo a crise dos Estados socialistas. E entramos numa ofensiva do Estado mínimo neoliberal.

E hoje, nem o 8, nem o 88. Essa Constituição, ela antecipou o futuro. Ela é uma Constituição para a reconstrução dos escombros, os escombros do capitalismo, num mundo pós-neoliberal. Olha agora, no mundo inteiro, onde o capitalismo é mais forte.

O que é que Wall Street, o que é que os grandes setores financistas estão pedindo para salvar o capitalismo? Intervenção do Estado, controle dos mercados, dos fluxos de capital, de cláusulas sociais nos negócios. O tamanho da nova Carta Constitucional tem a dimensão da vontade da maioria dos constituintes na superação dos problemas do passado.

É característica das constituições do segundo a pós-guerra um certo caráter analítico. Creio que nós no Brasil tenhamos talvez exagerado a dose. Várias pessoas sabiam que nós estávamos saindo de uma excepcionalidade institucional para um reordenamento constitucional.

E aí se fez uma construção que é longa, claro, ela acabou tendo excesso. Há matérias que são, sem dúvida nenhuma, de legislação infraconstitucional. A minha preocupação era evitar que ela fosse muito detalhada, porque isso introduziria muita rigidez no processo político-administrativo brasileiro. Porque mudar a Constituição sempre é uma coisa complicada, complexa. E, na verdade, o que era objeto de leis em outros países acabou entrando na nossa Constituição.

Como a nossa Constituição é muito analítica, detalhada, pormenorizada, toda vez que você quer mudar a ordem jurídica no país, você precisa de uma emenda constitucional. Por isso que nós já temos hoje 53 emendas, mais 6 emendas de revisão, são as 60 emendas constitucionais no nosso país. O legislador ordinário ficou muito apequenado, porque ele não pode criar muitas normas, tendo em vista que tudo está estampado na Constituição.

A gente não olhava para o futuro. A gente só queria apagar o passado. E tudo que nós fazíamos era tentando corrigir erros do passado. Nós emergíamos de um sistema de vinte e poucos anos de ditadura militar.

Então havia uma preocupação em segurar a democracia, garantí-la. O povo brasileiro estava ansioso. para ver os seus direitos.

A nível constitucional, os direitos do povo colocados num patamar superior, como uma coisa a ser mais venerada pela nação, mais respeitada pelos governantes. Isso é uma virtude da Constituição e não um defeito. Ela quis fazer, quase botar na Constituição, um programa de governo, quando na realidade a Constituição tinha que estabelecer regras para que as pessoas, para que os diversos partidos disputassem o poder e pudessem... implementar o seu programa.

Ela foi elaborada num momento, digamos assim, de um desaguador de muitas demandas reprimidas. Todas as camadas da população tinham reivindicações que queriam ver inseridas na Constituição porque não acreditavam, por exemplo, que ela pudesse ficar para leis ordinárias, leis complementares. A expectativa também de que problemas econômicos e sociais acumulados nesse período e agravados pela inflação, o Brasil vivia seu quinto ou sexto ano de superinflação, inflação acima de 100% ao ano.

Isto fez com que também houvesse um ímpeto muito forte na direção de resolver as questões de justiça social, de progresso, etc. na letra da Constituição. No caso brasileiro, a experiência é que se não tiver escrito, não acontece. E se não tiver escrito como auto-aplicável, nunca vai se aplicar. Até hoje. Até hoje as pessoas estão querendo mudar a Constituição a todo instante, toda hora está sendo apresentada proposta de emenda à Constituição, como se a Constituição fosse um texto ordinário, fosse um texto que você pudesse estar mexendo toda hora.

O tamanho da Constituição brasileira é o tamanho do arraso que a ditadura militar produziu sobre o país. Eu acho uma falácia essa discussão sobre a extensão da Constituição, ou sua atualidade, ou que ela é um fator de ingovernabilidade. Eu diria o contrário, ela é um fator de... governabilidade. Se não fosse ela, nós não teríamos sobrevivido às crises que tivemos.

O derradeiro desafio foi preservar as conquistas democráticas alcançadas e preparar o caminho para o desenvolvimento sem traumas de uma sociedade mais justa e igualitária. Na Constituinte, por mais que os partidos já fossem fragmentados, por mais que os partidos já fossem desunidos, por mais que interesses pessoais, por mais que lobbies influíssem, o fato é que você conseguiu realmente discutir o Brasil. Ela estabeleceu direitos sociais que passaram a vigorar e que abriram e tornaram condições do país ser um país mais justo. Segundo lugar, é que nós temos um capítulo de direitos individuais exemplar. para o mundo inteiro.

Olha, é muito democrática. Ela realmente deu direitos, que é uma coisa importante. Ah, deu mais direitos do que deveres. Toda Constituição dá mais direitos do que deveres. Você não vai votar na Constituição deveres, vai votar direitos.

A Constituição é feita para garantir. Garantir o cidadão, garantir o trabalhador, garantir a liberdade. Isso está lá. Eu acho que isso está bem na Constituição.

Chegar-se ao fim de um processo de impeachment na América Latina, sem sequer murmúrios de intervenção militar. de pressões militares e outras crises que sucederam, me parece que dão, em termos institucionais de construção da democracia, um saldo extremamente positivo à Constituição. A Constituição ajudou muito a afirmar essa consciência de que todos nós somos responsáveis pelo país.

Acho que essa foi uma conquista. que veio dos movimentos populares, mas que a Constituição legitimou. A Constituinte foi mais um capítulo na derrota da esquerda. O Golbery foi o grande vitorioso. O Golbery conseguiu uma transição lenta, gradual e segura.

E nós queríamos uma transição rápida, mais radical, e não temos nenhum problema com segurança. Esse texto não existe mais, né? Esse texto aqui...

é um documento histórico. A Constituição que nós temos ainda não tem nada a ver com isso. Este aqui é contraditório, mas ele tem elementos fundamentais que permaneceram. O que restou é extremamente importante.

E nós temos que defender com unhas e dentes. Se você focar em cima dos constituintes da época, você vê uma vontade imensa de muita gente boa de... transformar o país.

A Constituição brasileira é muito boa. Mesmo tendo sido duramente atacada por Inimigos, já nem dá uma grande conção. E ela proporcionou nesses 20 anos um progresso, uma evolução. A Constituição garantiu a estabilidade e a solidez das instituições democráticas no Brasil.

Esperamos que por longo e longo tempo. Ela tem seus problemas, mas eu considero que o resultado final foi bastante razoável, generoso e que vai acabar produzindo um país com um crescimento... movimento robusto, com liberdade.

E é só você comparar realmente hoje o que era o país anos atrás, o que é hoje. É claro que cada vez mais temos que melhorar na questão da educação, na questão da eliminação da miséria, que a todos nos humilha, entendeu? E a própria redução da pobreza. Eu acho que a ousadia minha de estar falando isso, mas eu não tenho medo de fazer um congresso revisor novamente.

Eu acho que o povo está muito amadurecido. Eu não me sinto tanto mal falando dela. mas que é das nossas constituições a mais humana, é a única que abre o seu pórtico com os direitos e garantias individuais, com as garantias fundamentais.

Nas constituições passadas isso era lá no meio, primeiro eu conversava com o Estado, hoje não. A figura central da nossa Constituição de 1988 é o ser humano. Um dos principais fundamentos e objetivos da Constituição é permitir uma alternância de poderes. campo democrático.

Tivemos várias eleições funcionando com plena liberdade, um sistema que hoje é copiado em vários lugares do mundo, a justiça eleitoral cada vez se aperfeiçoando mais no controle das eleições. O Brasil de hoje é um país essencialmente democrático. Não acredito que haja uma pessoa que seja capaz de contestar isso, que esse país...

É uma verdadeira e sólida, indestrutível democracia. É indiscutível que a Constituinte nos levou ao Estado democrático e direito, que era a grande e maior aspiração daquele momento. A Constituição de 88 é, de longe, a mais democrática de todas as que o Brasil já teve. Mas não há dúvida que nós entramos num clima de segurança institucional como nunca se viu na história constitucional brasileira.

Eu não vejo a menor possibilidade de retrocesso nem no campo. nem no campo político, nem no campo econômico, nem no campo social. Nós nunca tivemos 20 anos de democracia de massa contínua, em 508 anos da história.

Nunca antes nesse país, como se diz por aí. Isso é privilégio da Constituição de 88 e só por isso ela merece respeito. Durante muito tempo nós identificamos o orgulho nacional com a ditadura militar.

Identificávamos o hino e a bandeira com o regime de força. Eu acho que... que a devolução do Brasil a si próprio, que ocorreu com a Constituinte, deu a todos nós, não o dever, o direito de cultuar nossa história, o nosso hino, a nossa bandeira, a nossa capital. Este sentimento não é mais propriedade de ninguém. Prometo manter, defender e cumprir a Constituição.

observar as leis promover o bem geral do povo brasileiro sustentar a união a integridade e a independência do Brasil